sexta-feira, 3 de setembro de 2010

RELATO BREVET 1001 MIGLIA - NERVIANO-IT - 16 - 22/08/2010 - RUBENS P.GANDOLFI

RELATO BREVET 1001 MIGLIA - NERVIANO-IT - 16 - 22/08/2010 - RUBENS P.GANDOLFI 3a PARTE pág.01
8- A PROVA - FINALMENTE - CONT.
DEIVA MARINA PC16 - CASELLA LIGURE PC17 92Km - 1424Km ACUMULADOS
A ansiedade com a proximidade da chegada fez com que não conseguisse dormir as cinco horas previstas em Deiva Marina. As 04:30hs já estava acordado e arrumando o material para a partida, que ocorreu ás 05:10. Como o PC apresentava condições precárias de alimentação, decidi partir sem comer, e, como já estava por amanhecer, procuraria um bom café na localidade mais próxima, o que acabou acontecendo. O trecho de 92km seria praticamente o último com fortes subidas: já na saída de Deiva subi de 0m à 500m em 12km, descendo novamente ao nível do mar no km24. Subidas leves até o Km 56, com 160m. Do Km 56 ao 72 a maior inclinação da etapa, atingindo 700m. Do km72 ao 92 leve descida, com chegada e Casella Ligure em 400m. Outro momento de emoção foi identificar, nestes aclives e também nos da etapa de Deiva, os de maiores inclinações, mensagens de incentivo de fãs, pintadas na estrada para os participantes do Giro da Itália. Sim, pedalamos por diversos trechos onde passaram os melhores ciclistas de competição do mundo. Os dias continuavam claros e ensolarados, as subidas eram amenizadas pela temperatura ainda razoável (22-25oC) do início da manhã e também pela grande vegetação das encostas das montanhas, em um cenário que lembrava muito nossa serra de Nova Petrópolis, Caxias. Pedalando sozinho, procurei curtir um pouco a paisagem e o grande número de ciclistas que cruzavam no sentido contrário. Era sábado pela manhã e incrível o número de speedeiros que passavam, em geral com uniformes de suas equipes, girando em pelotão. A etapa foi cumprida em cinco horas e trinta e oito minutos, média de 16,3Km/h, cheguei 10:48 da manhã. O PC de Casella era excelente, com grande variedade de alimentos: massa, risoto, pão, salada, frutas e muitos componentes da organização que, além de carimar o passaporte, abasteciam nossos tempos no site com o cartão magnético. Grande número de cilistas estavam por lá e era nítido a mudança de astral: todos muito alegres e praticamente já comemorando a chegada. Faltava apenas mais um PC e 201km para Nerviano. Lembro de ter comido muuuuuito neste PC, de quebra tomando aquela cervejinha. Parada de uma hora e dez minutos e partida para o derradeiro PC às 11:58hs.
CASELLA LIGURE PC17 - CASTELLANIA PC18 55Km - 1479Km ACUMULADOS
Sob o solzão do meio-dia partí para Castellania, curto tercho de 55km que iniciava-se com leve declive dos 400m de Casella Ligure até 170m do km45, sem nenhuma subida neste trecho. Do km 45 ao 52, subida até 360m, altitude da localidade de Castellania. O trecho foi cumprido em 02:47, com média de 19,8km/h. Poucos quilometros antes da chegada, a última forte subida da prova. O corpo acusa o cansaço, mas a presença de enormes murais em preto e branco com fotos de um ciclista antigo, na entrada da cidade, aguça minha curiosidade. A cada avanço novas fotos e dizeres pintados no asfalto com listas de títulos obtidos no Tour de France e Giro da Itália. Quando chego ao PC, tudo fica esclarecido: em Castellania nasceu e morreu Fausto Coppi (15/09/1919 - 01/01/1960) recordista mundial da hora em 1942, campeão do Giro Da Itália em 1940, 47, 49, 52 e 53, Tour de France 1949 e 52, campeão mundial de perseguição (1947 e 49) e de estrada (1953), considerado um dos ciclistas mais completos de todos os tempos. O PC foi montado no local onde está seu túmulo, um monumento e uma sala com suas bicicletas, vestimentas e troféus. Coppi é um verdadeiro mito na Itália. Outra grande alegria foi a surpresa de reencontrar no PC a Joana e a Raquel que estavam com dificuldades de localizar o Isac e vieram acompanhar minha chegada. Aí cabe um esclarecimento: nem sempre o carro de apoio podia seguir por estradas pequenas e sinuosas em que os randonneurs seguiam. Ou por proibição da organização (isto estava marcado no road book que recebemos e as meninas tinham cópia) ou mesmo por serem estradas com muitos retornos e de difícil navegação. Desta forma, muitas vezes só encontrávamos o apoio realmente nos controles. Tais fatos me trouxeram novo ânimo para encarar a última e mais longa (em quilômetros) do giro: sim, estava à 146Km da glória. O controle de Castellania não apresentava muita estrutura, tomei bastante água, abasteci a mochila de hidratação, algumas fotos no monumento de Coppi e às 15:30 parti para a derradeira etapa. A meta era Nerviano até 21:00hs.
CASTELLANIA PC18 - NERVIANO PC19 146Km - 1625Km ACUMULADOS
A etapa final apresentava-se plana com a incial descida dos 360m de Castelania até aproximadamente 100m no Km15. A idéia de chegar em Nerviano às 21:00hs começou à dar errado logo na saída do PC: em um dos poucos trechos de falha, o GPS não indiciava o caminho correto e as setas aplicadas no asfalto apontavam dupla interpretação. Na ânsia de chegar, acabei por não consultar o road book (livreto impresso distribuído pela organização) e segui por um caminho errado. Subí cerca de 5 Km, não encontrava ninguém para obter informação, até que um habitante local informou que na direção que seguia não havia saída. Se tivesse consultado o road book, de cara teria visto que o trajeto era descida, e não subida como estava seguindo. Retornei por onde vim e após falar com meia dúzia de pessoas, acionar o gps e ler o roadbook, avisto ao longe um ciclista com a camisa 1001miglia. Apresso em alcançá-lo, confirmo se ele sabe onde está e sigo com ele dali por diante. Passado alguns quilômetros, a confirmação: o gps reencontra a rota. A "barbeiragem" me toma cerca de uma hora e meia. O ciclista era um senhor italiano do sul da Itália, próximo à Napoli, aparentando um 65 anos, e com a experiência de diversos brevets internacionais, dentre eles um randonneur 5000Kms costa à costa nos EUA, de 20 dias. Sigo com ele mas noto que aparenta algum cansaço. Após alguns quilômetros comenta que estava com fome e que precisava parar no próximo bar para se alimentar-se. Nesta hora o calor castigava. Sentia-me bem e queria seguir mas senti-me, não sei porquê, na obrigação de acompanhar aquele senhor. A parada no Bar foi longa, comemos Panitos (torradas) e conversamos com alguns companheiros que lá chegaram. Seguimos adiante e novas paradas para que o senhor tirasse "água do joelho". Outros motivos de parada éra para checagem do road book. Meu companheiro seguia o road book e não confiava muito em minhas indicações, baseadas no gps que voltava à funcionar normalmente. Pensei várias vezes em segiur adiante sozinho, mas algo de inexplicável fazia-me ficar acompanhando meu colega. Aproximava-se a noite e nova parada para comer um gelato (sorvete), segundo ele retribuição por eu ter pago sua conta no bar anterior. Com a chegada da noite aproximamo-nos de Nerviano e com a chegada intensificava-se o número de cruzamentos e mudanças de direção. Sob o ponto de vista da navegação era o tercho mais complexo. Apesar do GPS estar ok, acabei por seguir o senhor-ciclista que fazia rotineiras paradas para checar o road-book. As setas no asfalto confirmavam o acerto da rota. Tudo ia bem (exceto a baixa velocidade) até que as setas sumiram e na checagem do roadbook a constatação: estávamos fora de rota. Olho para o gps e também já não estava em posição. Gira daqui, gira dali e nada. Pergunta para um e para outro e nenhuma orientação. Também nenhum randonneur próximo, o que indicava que estávamos muito perdidos. Por vários minutos segui o senhor-cilista em suas intuições de tentar localizar a rota. A noite já avança e a tensão aumentava. Havia sinalizado à Joana que chegaria por volta das 21:00 horas, passei à enviar torpedos que estávamos atrasados e não tínhamos previsão de chegada. Queria chegar logo também para que pudesse liberar a Raquel no carro de apoio para reencontar o Isac. Outra questão importante: na Itália, principalmente interior, não há uma viva alma nas ruas depois das 21:00 horas. Já bastante irritado com a situação, que deveria ser de alegria pela chegada, vejo, em um breve momento, que a seta branca de localização do gps aproxima-se da linha rosa de rota da prova. Giro a bike na suposta direção e informo o randonneur italiano: vou seguir por aqui, é o que o gps está informando. Nem aguardo sua resposta e saio queimando pneu na direção indicada. Dou uma olhadinha para trás e vejo que ele acompanha. Aumento o ritmo e cerca de uns três quilometros depois estou com a seta branca novamente posicionada na linha rosa. Ufa, aumento ainda mais a velocidade, que passa dos 30Km/h,, e constato que ainda há uns 10Km para a chegada. O senhor randonneur segue junto até o final. A emoção começa à tomar conta, lembro de tudo e todos que me ajudaram à chegar até aquele momento. Mais algumas curvas e entro na avenida que dá acesso ao parque de largada/chegada em Nerviano. A Joana, Raquel e um grupo de voluntários estavam à minha espera e começa a grande festa. Encerro a prova às 23:45hs de 21/08/2010, com 122 horas e seis minutos de prova, distribuídos em 35:14 de paradas nos PCs e 86:52 de pedal (não computados aí tempos de para entre PCs).
9- A CHEGADA
Muitas lembranças na chegada, entrego o cartão de rota para a mesa organizadora, que confere e já me devolve. Recebo na hora a pesada, grande e belíssima medalha de Finisher 2010 1001Miglia , bem como o certificado da prova. Para relaxar, faço alguns alguns apoios e abdominais para provar que estou inteiro, rsrsrsrrs. Não conseguia me conter de felicidade, em superar tamanho obstáculo e de uma forma até certo ponto surpreendente. Converso com a Joana e procuro saber notícias do Isac. Após algumas incertezas e aflições, Daniel (voluntário da prova que pilotou umas das duas motos em todo o percurso) informa que Isac havia perdido-se novamente, mas localizado e estava novamente em rota, com previsão de chegada no domingo pela manhã, próximo ao horário de fechamento, 12 horas. Ficamos por ali mais alguns instantes, acompanhamos a chegada de alguns ciclistas e segui para nosso confortável Hotel Poli em Nerviano, PEDALANDO os 3km, banhado em alegria. Sem fome, mergulhei na banheira e fiquei lá por longo tempo. Após seis noites dorminho em colchonetes, aquela mega cama 2x2 parecia o paraíso. No Domingo pela manhã, nada de acordar tarde. Às 09:00 já estava desperto e com a Joana fui tomar um farto café no bar do Hotel. Rumamos para o parque de chegada, junto com a Raquel, esperar o Isac que chegou por voltas das 11:30hs com grande festa. Estava fechado os 100% de aproveitamento da saga de três brasileiros, os primeiros à concluir um brevet internacional de 1600Km e considerado um dos mais difíceis do mundo. Na lista final de chegada, 228 randonneurs de 23 nacionalidades diferentes. Largaram 269 ciclistas.
10- AGRADECIMENTOS
À Deus por ter me dado força física, espiritual e econômica para concluir este brevet. Por sua proteção em todos os momentos da jornada, de forma que não tivesse passado por nenhum grande sobressalto. À Joana, minha grande esposa e companheira que não hesitou em acompanhar-me nesta loucura, prestou apoio incondicional, com grande incentivo em todas as mimhas paradas. Te amo muito, e a medalha é nossa. Às minhas filhas, senti muitas saudades de vocês. À minha irmã Grace pelas mensagens de apoio e pelas inúmeras postagens no Blog e divulgação de informações para que todos pudessem acompanhar aqui no Brasil. À minha vó Iracema Gomes Pinheiro, que deve ter assistido tudo com muito orgulho, de onde estiver. À minha mãe, pai, amigos, sobrinhos, cunhadas e cunhados que ficaram aqui na torcida. À meus grandes e inseparáveis amigos Roberto Pena Trevisan e Paulo Carneiro Endres, com quais pedalo a maioria das provas de Randonneur no Brasil e com certeza também estavam lá comigo. À Isac Chedid Saud Filho e Raquel Saud pela iniciativa e agradável companhia nesta aventura. Valeuuuu. À Fermo Rigamonti, Diretor Geral da Prova, simpático senhor e um dos randonneurs mais respeitados na Itália, capitão da equipe 1001 Miglia (sim, 1001 Miglia também é um clube) nas edições do PBP. Fermo é bastante calmo e organizado, procurando sempore transmitir ao ciclistas mensagens de incentivo e torcendo por todos. À todos os voluntários, em especial o inesquecível Gaetano Bollini, que recepcionou-nos em sua casa, na chegada e na partida, ao motobiker Daniel, sempre preocupado comigo e o Isac e o Max, um jovem ciclista também muito dedidcado e responsável pelo abastecimento dos tempos no site. À Luis M. Faccin nosso representante ACP Brasil, grande randonneur 5000, por tudo que tem feito pelo ciclismo de longa distância, principalmente no Rio Grande do Sul. À todos meus colegas randonneurs com quem já tive o prazer de pedalar ao longo de 52 brevets, dos quais me atrevo mencionar : Edimar Silva (Graxa), Thales Moreira, Edson Alves, Vitor Matzembacker, Alex e Simone, Bagatini, Udo, os barsiliúchos Oswaldo, Demeure e Roger Ban, Carlos Polleselo, Luiz Lazzary, Rolf, Anderson, Rafael, Dacivaldo, Rodrigo Cortese, Júlio Siluk, Glademir Ximitão, Moogens, Voluntário nota 11 Miguel, César Barbosa, Guilherme, e muitos outros que peço desculpas por não citar aqui.
Em 2012 tem mais!

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